domingo, 16 de novembro de 2008

Ensinamentos da vida

Lição 1: nunca julgue.

(conversa entre primas)
- Alô, Gi? Tudo bem? Sabe o fulano, que desde que virou evangélico vivia dizendo que eu e você íamos pro inferno porque somos "juntadas" e não casadas?
- Ah, sim. " Juntado com fé, pecado é", não é isso que ele dizia?
- Pois é, menina. A namorada crente dele tá grávida. Os dois estão morando juntos.
- Ixi, mais um pra dançar lambada com a gente no inferno. Vai bombar, hein? Detesto muvuca.
- Relaxa. Namorada crente grávida? Ele é muito mais VIP do que nós, vai ganhar pulseirinha pro camarote, com certeza.

Lição 2: leve a sua merda com você.

(idos de 1998, por volta das 7 horas da manhã. Estudante mau humorada indo para a faculdade cheia de ódio no coração se depara com uma japonesa de 50 e poucos anos e seu cocker spaniel. A japonesa morava no prédio da frente e todas as manhã levava seu cachorro para cagar. Para cagar na árvore que ficava em frente à casa da estudante. Estudante que sempre se perguntava quem era o filho da puta que fazia aquilo. E então ela descobriu.)
- Dona, esse cachorro é seu?
- Sim.
- Então esse cocô também é seu. Portanto, leve a sua merda com você.

A mãe da estudante assistiu a tudo, falou pra ela se comportar, mas no fundo, beeeem lá no fundo, adorou.

Lição 3: nunca passe a mão na bunda de uma mulher, só se ela pedir.

(carnaval, 1999. Tia e sobrinha desfilam devidamente paramentadas pelas ruas de um pequeno balneário do Espírito Santo. A tia vestida de Xuxa e a sobrinha, de Sasha. Cada uma com uma latinha de cerveja nas mãos. Bloco "sujo", banda na rua, várias pessoas conhecidas, amigos e parentes também estavam por lá, tudo ótimo, clima de muita alegria, quando de repente...)

- Ele passou a mão na minha bunda!
- Quem?
- Aquele cara de chapéu branco.
- Ah, não. Vamos voltar.
- Vamos.

Voltaram e quebraram o cara de chapéu branco na porrada. A Xuxa e a Sasha.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Quatro pães, um rolo de fita a menos e elegância de sobra.

Desde que comecei a me aventurar nessa coisa de blog, fico mais atenta ao que vejo e ouço. Antes éramos apenas eu e meu Ipod pelas ruas, alheios ao que acontecia ao redor.
Agora tenho o cuidado de observar reações e situações e eis o que presenciei no último sábado de manhã , quando saí pra comprar pão no supermercado perto de casa:
" Quero quatro paezinhos por favor", disse uma senhora bem idosa que estava na minha frente na fila. Depois de mim, uma outra mulher e um senhor.
A atendente colocou os pães na sacola plástica, fechou e quando foi pesar, percebeu que a máquina estava sem fita.
"A senhora espera um instante? Vou pegar outro rolo de fita."
Foi e voltou em menos de um minuto. Colocou desajeitadamente o novo rolo na máquina e tentou por alguns segundos ligar a bendita, mas não conseguiu.
Foi quando o tiozinho que estava no final da fila começou a berrar. " Que demora. Isso é um absurdo. Anda logo, minha filha. Que lerdeza."
A atendente, uma polaca baixinha e gordinha, ficou instantaneamente vermelha de vergolha e explicou: " desculpe senhor, sou nova aqui, é minha primeira semana e ainda não aprendi a lidar com essa máquina." A coitada falou sorrindo mas com um desconcerto evidente na voz.
" Não tem isso de nova não, já é a terceira vez que venho essa semana e é essa demora toda." Ele esbravejava num tom que era uma mistura de ironia e ódio. " Tem que consertar essa máquina", continuou o cara, olhando para as demais pessoas da fila, como quem busca um aliado.
Cada vez mais nervosa, a atendente desajeitada chamou uma colega que conseguiu trocar a fita. Tudo isso aconteceu em menos de três minutos.
A senhora que era a primeira da fila ofereceu seu lugar para o velho insandecido, que recusou dizendo que queria apenas ser respeitado. A mulher atrás de mim ria daquela babaquice toda, meio que não acreditando no que estava presenciando.
"Pronto, quatro pães. Desculpe a demora."
" Não se desculpe e não se envergonhe. Não demorou nada", respondeu a senhora olhando diretamente nos olhos do maluco, que não se aguentou: " a madame está tentando me deixar com cara de idiota, né?"
" Até tentei, mas você já tinha feito isso sozinho."
Virou-se e foi embora.

sábado, 18 de outubro de 2008

A velha história - cap. 2

Joana tinha uma vida difícil em Santiago, mas era muito melhor do que o que vivia no Brasil.
Por causa de seu corpo bonito e bem torneado, conseguiu uma vaga de dançarina numa boate.
Não era exatamente o emprego dos seus sonhos, mas pagava as contas.
Seu grupo de capoeira ainda era novo e pouco conhecido e tinha apenas meia dúzia de alunos iniciantes.
" Quando já estiverem mais graduados, vamos começar a visitar as outras academias para mostrar nosso ' jogo de dentro' e para que todos saibam quem nós somos." Joana ainda não tinha se dado conta, mas tinha os mesmos pensamentos ultrapassados de seu mestre, os mesmos pensamentos que tanto criticara e tanto a decepcionaram.
Não admitia que seu casamento havia sido de conveniência, mas a verdade é que nunca tinha sentido amor de verdade por Martín. Ele a amava e ela se aproveitou disso.
Morava no porão da casa de um aluno. Era pequeno, mas bem iluminado. Já tinha conseguido mobiliar o pequeno espaço com fotos de capoeira e troféus de campeonatos. Pendurou algumas camisetas trocadas com outros mestres. E no destaque, seu diploma de Mestre de Capoeira. Tinha lutado muito por ele, foram dias difíceis, em que teve que juntar todo o dinheiro que tinha para pagar o exame e receber a tão sonhada corda branca.
Joana dava aulas em uma sala emprestada por um professor de boxe. Não era o local ideal, mas era o único que tinha disponível. Seus alunos, mais amigos do que alunos, entendiam a situação e faziam vistas grossas para a estrutura precária. Também colaboravam comprando papel higiênico e de vez em quando, pagando a conta de luz.
No fundo, eram uma grande família, em que todos se ajudavam. O relacionamento com seu antigo mestre tinha se corroído e os dois não se entendiam mais. " Minha família está aqui, no Chile."
Ela precisou aprender a se contentar com o pouco. Sempre dizia que " para quem não tinha nada, pouco era tudo". E se orgulhava de tudo que tinha.
E de qualquer maneira, Joana tinha ido mais longe do que qualquer outra pessoa de sua família verdadeira. A maioria de seus parentes nunca saiu do interior da Bahia.
" Eles nunca tiveram coragem de se levantar e acender a luz."

A velha história - cap. 1

Acordou cedo e ligou o computador antes mesmo de escovar os dentes. Aquela máquina já ultrapassada, que tinha recebido vários upgrades demorava alguns minutos até ficar no ponto para ser usada.
Escovou os dentes, fez um café e tirou o pijama, tentando mostrar certa tranquilidade, meio que querendo disfarçar para si mesma a ansiedade.
Finalmente o café ficou pronto e o computador também. Entrou no msn e tomou um gole de café, esperando que sua amiga aparecesse entre os on-line.
Ainda ontem as coisas haviam sido diferentes para Ester. Geralmente não entrava na internet antes das 14 horas, quando já estava no trabalho. Mas quando por acaso recebeu um email de uma amiga pedindo que entrasse no msn naquela manhã, tudo mudou.
Passou a noite pensando na amizade das duas e em todas as outras amizades que ficaram para trás, desde que saiu de Curitiba e voltou para sua cidade natal, Vitória.
E agora, quase uma década depois, havia voltado para Curitiba, mas não tinha mais como encontrar seus velhos amigos.
Por isso ficou feliz quando viu aquele email, mal podia acreditar.
E então, apareceu na tela uma mensagem pedindo que ela aceitasse outro usuário em sua lista de contatos.
" É ela", pensou. Abriu um sorriso infantil quando leu no monitor a primeira mensagem:"Hola, chica!". Era Joana.
Começaram o papo animadas, querendo marcar um reencontro, matar as saudades e colocar em dia os acontecimentos dos últimos oito anos. Mas Joana estava morando em Santiago, capital do Chile, há alguns anos. Na verdade, tempo suficiente para já misturar as palavras em português e espanhol.
Filha de baianos, Joana era uma pessoa humilde, com pouco estudo e poucas chances na vida. Perdeu a mãe quando tinha apenas 8 anos e foi criada pelo pai. Com 16 anos saiu da Bahia e foi sem rumo descendo o Brasil, até parar em Curitiba. Foi quando conheceu mestre Tomé e a capoeira.
Sua vida mudou, aprendeu a ter disciplina e logo era uma das melhores do grupo. Aquilo era sua vida e o reconhecimento que tinha dos demais integrantes alimentava seus sonhos de um dia ter seus alunos e repassar tudo o que havia aprendido com Tomé.
Por isso, quando surgiu a oportunidade de dar aulas de capoeira no Chile, ela foi. Mas era uma roubada. Passou dificuldades, passou fome, passou frio.
Mas depois que conheceu Martín, as coisas melhoraram. Casada com um chileno podia trabalhar legalmente e ter uma vida melhor. Assim foi e continua sendo. O casamento acabou, mas Joana já sabia como se virar. Finalmente tinha realizado o sonho de ter um grupo de capoeira. Não dava muita grana, mas era sua paixão. E ela fazia uns bicos para completar a renda.
- Fico feliz que esteja bem, Joana. Depois de todos esses anos sem notícias, é bom saber que deu tudo certo.
- É, ainda preciso batalhar, mas aquela mocinha que saiu da Bahia já não tem mais medo do mundo.
Joana era uma pessoa diferente. Gostava de desafiar seus medos. Tudo que a amedrontava, ela encarava. Dizia que era a única coisa que lembrava de sua mãe: " minha filha, quando tiver medo do escuro, levante-se e acenda a luz". E assim, ela ia acabando com seus medos, sempre levantando e acendendo a luz.
(continua)

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

3x0

Foi por causa de um jogo de futebol que tudo aconteceu. Ele resolveu mandar um email para ela depois que o time do seu país perdeu para o time do país dela.
Na verdade, muito já tinha acontecido de fato quando, por causa daquela partida os dois se reencontraram.
Sofia era uma carioca que morava em São Paulo. Pablo era um argentino que morava em Buenos Aires.
Se conheceram há mais de uma década pela internet, exatamente da maneira que todos dizem que não se deve conhecer as pessoas. " Eles sempre mentem a altura", " elas nunca são tão magras como nas fotos que te enviam", " os argentinos são uns nojentos, só querem mesmo saber de sexo", " as brasileiras são macumbeiras, essa aí vai te enfeitiçar".
Mas na contramão de todos os comentários muito pessimistas, Pablo e Sofia decidiram se encontrar pessoalmente.
Na época, a Argentina estava afundada numa crise sem precedentes. As coisas estavam realmente ruins para Pablo, um fotógrafo iniciante que era diariamente bombardeado pelo pai - que trabalhava na bolsa de valores - com conselhos para buscar uma profissão mais promissora. Estava cansado de tudo aquilo, mas determinado a insistir em sua vocação. Vivia sozinho em um apartamento de um quarto no bairro da Recoleta, em Buenos Aires e viajava quase todos os finais de semana para Mar del Plata, sua cidade natal, para ver sua família.
Sofia morava ainda na Cidade Maravilhosa, mais precisamente no Leblon. Estudava administração numa faculdade particular e não tinha muito interesse pelo futuro, fazia o que tinha vontade e vivia o momento. Era uma pessoa impulsiva e sincera - "até demais", dizia sua mãe. Sabia que muita gente não gostava do seu jeito e ria disso. Sabia ser fiel a si mesma.
Os dois tinham mais ou menos a mesma idade. Ele dois anos a mais.
E assim ficou decidido. Era janeiro e Pablo passaria duas semanas no Rio, na casa de Sofia.
Foram 14 dias intensos e mesmo sendo a primeira vez que estavam juntos de fato, era como se já se conhecessem há muitos anos. A sintonia era incrível. O amor era recíproco e tranqüilo, como apenas um amor antigo pode ser.
Mas as duas semanas passaram rápido e o contato, antes diário foi ficando menor, até que pararam de se falar.
" Uma dessas coisas tristes da vida", pensava Sofia toda vez que lembrava de Pablo. E toda vez que lembrava dele, uma mistura de sentimentos era o que sentia. " Mas sempre esse frio na barriga".
Sabia que não se veriam novamente, mas o tinha muito presente em sua vida. Nunca falava dele para ninguém, queria-o só para ela, queria aquela história somente na sua lembrança.
Uma vez, quatro anos depois de se encontrarem, ao voltar de uma festa, bêbada, tomou coragem e ligou para ele.
" Vai pensar que sou louca, ligar depois de tantos anos". No fundo, tinha certeza de que o número do telefone tinha mudado. Mas ligou e achou que seu coração fosse sair pela boca quando ele atendeu.
Conversaram banalidades, ela perguntou se ele a amava, ele disse que sim. Mas já estava com outra e não escondeu de Sofia a nova namorada. E ela também estava com outro. Mas Sofia sabia que era apenas mais um. " Não senti o frio na barriga", explicava para as amigas que não entendiam como ela sempre enjoava dos namorados depois de algumas semanas. " Não senti o frio na barriga", explicava para os namorados ao terminar o relacionamento.
No dia seguinte, uma ressaca. Não conseguia lembrar direito o que haviam conversado, mas pouco importava a ela. " A voz dele não mudou nadinha".
Pablo era a pessoa mais sensível que Sofia conhecia e era isso que fazia dele uma pessoa inesquecível.
Pretendentes sempre tinha aos montes, mas escolhia sempre a dedo com quem queria ficar. Depois de muito tempo buscando um traço de Pablo em outras pessoas, finalmente entendeu que precisava mudar, dar a quem realmente podia, uma chance de fazê-la feliz.
E estava se saindo muito bem. Pensava cada vez menos em Pablo, e estava casada e apaixonada por seu marido. Eram muito felizes e todos diziam que eram o casal perfeito, que haviam sido feitos um para o outro.
Até esse jogo de futebol.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Pouca vergonha.

Situação 1 :
Jornalista, quando ainda não era jornalista e sim uma estudante universitária, conversa com a mãe :
- Ó, fiz uma tatuagem.
- Quê? Não acredito. Tatuagem? Tsc, isso atrapalha pra caramba na hora de procurar emprego, as pessoas enxergam isso como sinal de irresponsabilidade, de rebeldia, de...sei lá, mas não gosto de tatuagem.
- Sério mãe? Então nunca faça uma. Essas coisas não saem mais, são pra sempre. Tipo filho.
- Pois é, filha. E se você se arrepender?
- Ué, aí fudeu.
- É. Aí fudeu.


Situação dois:
Jornalista com TPM volta pra casa caminhando depois de um dia de cão. Passa no supermercado e compra o jantar. Isso significa que ela tem mais uma sacola para carregar, além da enorme que leva a roupa do futebol e da sua própria bolsa. Se paciência fosse algo palpável, tocável, tangível, ela chutava, enchia de porrada e depois cuspia na cara.
Com toda aquela carga e nem um pingo de simpatia, ela pára na calçada, esperando o sinal ficar vermelho para os carros e, obviamente, verde para ela. Uma senhora também aguarda.
Duas meninas de, no máximo, 17 anos passam de mãos dadas: pareciam ser namoradas.
A senhora olha com desaprovação, vira para a jornalista e diz:
- Acho uma pouca vergonha. Duas meninas novas.
A jornalista olha para as meninas, olha para a velha estupefata e responde:
- Minha senhora, cuide da sua vida.
O sinal fecha pra uns, abre para outros e todos seguem seu rumo.


Acho um saco essa coisa de todo mundo ter uma opinião sobre a vida alheia e fazer questão de revelar. Acho o fim esse povo que se enche de razão e aponta o dedo para o outro, sem lembrar que esse dedo poderia- e deveria- estar apontado para o seu próprio c*.
O que me importa se as meninas são namoradas ou não? O que te importa se eu tenho tatuagem?
A verdadeira questão é: no que as minhas ou as suas escolhas pessoais mudam o mundo? A economia piora por causa disso? Do outro lado do planeta ou aqui do lado mesmo, uma criança passa fome por causa disso? Um idoso passa frio por causa disso? Não? Não mesmo? O mundo melhora? A economia se recupera, uma criança enche a pança e um idoso ganha um cobertor? Também não? Então que se foda.

Porque eu deixaria de fazer alguma coisa que eu quero fazer e que não fere os sentimentos nem os limites de ninguém só porque uns e outros desaprovam?
Interessante seria alguém olhar estupefato para um político corrupto, ou qualquer outro tipo de safado, apontar o dedo e dizer que acha uma pouca vergonha.
Porque se é pra tomar conta da vida alheia, que seja a de quem enche os bolsos com a nossa grana, que se acha impune, acima de tudo e todos.
Acho um saco.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Me poupe, Herbert Viana.

Cirurgia de Lipoaspiração

Pelo amor de Deus, eu não quero usar nada nem ninguém,

nem falar do que não sei, nem procurar culpados,

nem acusar ou apontar pessoas, mas ninguém está percebendo

que toda essa busca insana pela estética ideal

é muito menos lipo-as e muito mais piração?

Uma coisa é saúde outra é obsessão.

O mundo pirou, enlouqueceu. Hoje, Deus é a auto imagem.

Religião, é dieta.

Fé, só na estética.

Ritual é malhação.Amor é cafona, sinceridade é careta,

Pudor é ridículo, sentimento é bobagem.Gordura é pecado mortal.

Ruga é contravenção.

Roubar pode, envelhecer, não. Estria é caso de polícia.

Celulite é falta de educação. Filho da puta bem sucedido é exemplo de sucesso.

A máxima moderna é uma só: pagando bem, que mal tem?

A sociedade consumidora, a que tem dinheiro, a que produz, não pensa em mais nada além da imagem, imagem, imagem.

Imagem, estética, medidas, beleza. Nada mais importa.

Não importam os sentimentos, não importa a cultura, a sabedoria, o relacionamento, a amizade, a ajuda, nada mais importa.Não importa o outro, o coletivo.

Jovens não têm mais fé, nem idealismo, nem posição política.Adultos perdem o senso em busca da juventude fabricada.

Ok, eu também quero me sentir bem, quero caber nas roupas, quero ficar legal, quero caminhar, correr, viver muito, ter uma aparência legal mas…Uma sociedade de adolescentes anoréxicas e bulímicas, de jovens lipoaspirados, turbinados, aos vinte anos não é natural.

Não é, não pode ser. Que as pessoas discutam o assunto.

Que alguém acorde.

Que o mundo mude. Que eu me acalme.

Que o amor sobreviva.

“Cuide bem do seu amor, seja ele quem for”.

Herbert Vianna (Cantor e Compositor )


Ah...me desculpem mas isso só podia ter sido escrito por um magro, que provavelmente não tem tendência a engordar e que, por ser famoso, só pega modelo.
Concordo que exista um exagero, que as pessoas estão recorrendo cada vez mais a essas coisas e cada vez com menos idade tb.
Não concordo que a sociedade consumidora só pense na imagem. Que não se importa com os sentimentos.
Será que querer ser jovem e bonito realmente significa esquecer todos os outros sentimentos, como ele cita no texto, ou isso acontece só com uma minoria? Será que isso é realmente um problema a ser discutido?

Um cara como Herbert Viana (que eu adoro, aliás), com o poder de persuasão que tem, devia escrever sobre os problemas que a grande maioria dos jovens enfrenta, como a falta de educação, de saúde, de esportes, de emprego, de comida na mesa, de políticos honestos, de árvore, de ar puro.
Devia pedir que as pessoas discutissem coisas realmente importantes, que ajudem a mudar o mundo.

E não, eu nunca fiz lipo e nem coloquei silicone, pq aos 32 anos, Deus foi generoso comigo. Se um dia precisar, entro na faca fáááácil.
E tb não quero levantar bandeira nenhuma, nem discutir um assunto que acho que não mereça ser discutido.
Me poupe, Herbert.

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Só de mim

Eu sou assim. Não exatamente uma pessoa normal. Já fui.

Quando era criança, queria ser como as minhas colegas da escola. Mas não deu. Não gostava das roupas, do comportamento, de nada que vinha delas.

Eu sou assim, do jeito que quero ser. Um dia acordo sensível, no outro com vontade de espancar alguém. Um dia me arrumo e me sinto linda. No outro, nem penteio os cabelos, mas ainda assim me sinto linda.
E lá vou eu, ser eu mesma, aceitando os rótulos de incoerente, louca.

Na verdade não me importo mais. Passei da idade de esquentar a cabeça com qualquer besteira desse tipo.

Falo palavrão pra caralho. Dizem que tenho a boca suja por isso. Tá. Eu bebo cerveja. Fico bêbada e falo merda. Também falo merda sem estar bêbada.

Uso tênis e calça jeans indiscriminadamente. Detesto fazer as unhas, então não faço. Só quando me dá vontade. Raspo as pernas porque depilar dói muito.

Acho homens muito românticos, muuuuito chatos. Mas de vez em quando eu gosto.
Ver um cara chorando por causa da namorada me dá vontade de rir e eu não me sinto mal por isso. Eu rio.
Tem dia que estou com preguiça de tudo. E nem ligo se preguiça é um desperdício.

Às vezes gosto de passar um domingo lindo de sol na cama. Às vezes prefiro a praia.

Tem dias que faço tudo malfeito porque estou de saco cheio.
Detesto cozinhar e minha casa é desorganizada. Até eu cansar da bagunça e arrumar tudinho.

Quando todos diziam que precisava me casar, troquei de namorado.
Depois, achavam que já era hora de ter um filho, mas comecei a jogar futebol. Deu vontade.

Isso foi pouco tempo depois que, quando pensavam que tudo estava se encaixando, já que eu tinha um bom emprego e um namorado bonito e inteligente, me mudei de cidade e de emprego, mas dessa vez mantive o namorado e fui morar com ele.
Porque emprego bom é mais fácil do que namorado bonito e inteligente. A gente se entende muito bem e isso também não se encontra em qualquer esquina.
Só não casei no papel, nem na igreja porque acho uma chatice. Mas eu sou uma senhora casada, sim. E não acho isso chato. Não uso uma aliança dourada porque não tem nada a ver comigo. Usamos, eu e ele, uma pulseira de prata. A nossa cara.
Adoro ouvir elogios apesar de nunca acreditar em nenhum. Sou mimada. Odeio o Faustão. Já fui viciada em chiclete mas parei. Gostava de filmes de terror mas agora fico com medo e fecho os olhos nas cenas fortes.
Queria ter superpoderes, um jato invisível e ganhar na Megasena.
Tem dias que eu odeio as pessoas que amo.
Mudo de opinião como quem muda de roupa: hoje eu não votaria de novo no Lula, não gosto dos Beatles. Mas meus princípios permanecem os mesmos de sempre.

Quando criança tinha medo de ir pro inferno. Mas entendi que Deus não faria isso comigo.

Acredito que vou viver feliz para sempre. E que ainda vou ter umas 3 ou 4 profissões dos meus sonhos.

Porque quem decide a hora sou eu. Porque eu sou assim e qualquer coisa diferente disso, não sou mais eu.

terça-feira, 10 de junho de 2008

Como é mesmo o seu nome?

Nausea.
Não, não estou me sentindo mal, não bebi demais no fim de semana, não estou grávida.
Nausea é o nome que um casal brasileiro escolheu para batizar seu filho.
Bizarro.
Meu nome não é muito comum, até hoje só conheci uma outra Gisela. Mas me sinto confortável com meu nome, acho que combina comigo.
Mas, imagine se olhar no espelho e dar de cara com você mesmo, o sr. Capítulo.Ou dona Brochura. Ou talvez, Ferrari de Souza.
Acredito que ninguém se sinta amado com um nome desses. É a deixa perfeita para crescer rebelde. E COM causa.
Afinal, não deve ter nada pior que crescer ouvindo piadinhas por se chamar Eulindo, Delícia, Haste, Nanashara ou Seila. Aliás, tem sim. Chamar-se Xerox.
Hoje li em um jornal que um juiz sueco decidiu a favor de um casal. Eles puderam, enfim, batizar o filho com o nome de um famoso brinquedo. Lego.
Vai ser difícil, é o prenúncio de uma infância confusa, de uma criança problemática. Principalmente no natal, escrevendo cartinhas: " Querido papai noel, fui bonzinho o ano inteiro e quero ganhar uma caixa de mim mesmo".
É quase impossível saber o que se passa na cabeça de um pai ou mãe que decide colocar um nome ridículo no próprio filho. Raiva da esposa que errou os cálculos da tabelinha? Ódio do marido que não quis fazer vasectomia? Ou um simples caso de fidelidade a um produto?
Imagine o pequeno Lego na escola. O professor irritado porque o garotinho tem conversado muito com Náiki, aquele malandro, e isso não está ajudando nas suas notas. Bom seria se ele estudasse mais, a exemplo de Halls ( ou Ráuls), o CDF detestado por todos, inclusive por Chamex , o garoto novo na sala.
Soube que na Nova Zelândia tem um coitado que se chama Superman. Isso porque seus pais foram proibidos de batizá-lo com a primeira opção da lista de nomes para bebês: 4real, que em português seria algo como " de verdade" ou " na real". Será que ele teve sorte ou azar? Superman ou 4real?
Recentemente, em uma conferência em Vancouver, Canadá, David E. Kalist e Daniel Y. Lee, dois economistas, apresentaram um estudo interessante chamado " Nomes e crimes: falta de popularidade significa problemas?".
A história é a seguinte: os caras pesquisaram os dados de mais de 15 mil homens em um estado americano para descobrir se nomes incomuns estariam ligados a comportamento criminoso.
A moral da história é: sim.
Então, se você, depois de sofrer durante anos com as piadinhas por se chamar Xícara ou Indice, surtar e matar seus pais, é bem provável que seus colegas de cela se chamem Pepsi, Lápide ou Ipod.

Atualização
matéria do dia 11 de junho, no site da BBC Brasil:
Mais de quatro mil crianças na China já receberam o nome Aoyun, que significa Jogos Olímpicos – em homenagem ao evento que será sediado na capital chinesa, Pequim, em agosto.
O problema é mundial, minha gente.

quarta-feira, 4 de junho de 2008

Bonito lá, horrível aqui.

“A gente respeita a sua personalidade”. Foi a última coisa que ouvi antes de mudar de canal. Na TV, o comercial do novo shopping center da cidade, o maior da América Latina, dizem por aí.

Que bom. Alguém nesse País respeita minha personalidade, pensei, com um sorrisinho debochado nos lábios.

No mesmo dia, saindo de casa rumo ao dentista, encontrei a vizinha perua do 14 no corredor enquanto esperava o elevador. Sabendo que meu irmão mora na África do Sul, ela começa a conversa: “que coisa horrível está acontecendo lá na África do Sul, né?”.

“É”. Não estava afim. Confesso que geralmente não estou. Mas ela estava querendo conversa. “Ele está em que cidade?”. “Joanesburgo, exatamente onde aconteceram os incidentes”, respondi.

Veja bem, moro no primeiro andar e esse foi o preço que paguei pela preguiça de descer pelas escadas.

Ela continuou falando algo sobre racismo, preconceito, xenofobia.Foi rápido, menos de dois minutos e o elevador chegou. Dentro dele, outra surpresa: o vizinho policial, com o jornal debaixo do braço e um bocado de opiniões na ponta da língua. “Bom dia, que frio, hein? Parece até que moramos em Curitiba!”, falou, rindo sozinho.

“Bom dia” respondeu a vizinha. Eu balbuciei outro “é”. Falar o quê? Rir de quê?

Logo o elevador chegou ao térreo e segui minha vida, mas ainda deu tempo de escutar os dois vizinhos conversando sobre o assunto do momento na cidade: um estabelecimento novo proibiu a entrada de pessoas da periferia, escolhendo quem entra ou não de acordo com as roupas que elas usam.

Sim. É exatamente aquele lugar que respeita minha personalidade.

E o pior foi escutar a voz da vizinha dizendo que “tem que proibir mesmo. Esses maloqueiros só querem saber de beber e roubar, de fazer baderna”. O vizinho concordando. O porteiro se calando, meio envergonhado por não ter um terno decente para visitar o shopping novo.

Nesse momento deu vontade de voltar. Vale lembrar aqui que moro em um bairro considerado nobre e de gente rica, mesmo que grande parte dos moradores não seja tão nobre assim (mas isso é coisa pra outro artigo), nem tão rica - e nesse ponto eu me incluo. Não voltei. Estava atrasada e com o humor no dedinho do pé, coisa boa não ia ser. Também é bom esclarecer que o tal shopping classe A está em um bairro de classe C e D, ao lado de um terminal de ônibus. Era algo que poderia ser previsto.

Mas enfim, Joanesburgo e Curitiba, não seriam dois casos de preconceito? De racismo?

Porque é inaceitável na África do Sul e aqui, do nosso lado é até um exemplo a ser seguido?

Lá estão expulsando estrangeiros por estarem "roubando" seus empregos e aqui, estão expulsando consumidores por estarem "roubando" seu status de gente bacana.

Talvez um dia as pessoas entendam que apesar de algumas coisas, como cultura, serem singulares, diferentes, únicas em cada país, outras coisas são sempre iguais, tem sempre o mesmo significado.

Preconceito é uma delas. E é sempre lamentável, em qualquer parte do mundo.

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Desperdício, descaso e a novela das oito

Esse mundo está perdido mesmo.
Além da fúria da natureza, com a qual teremos que nos acostumar já que ninguém quer parar de poluir - fúria, aliás, que só aumenta- temos também a crescente onda de violência, de abandono, de fome.
E isso é mais revoltante quando se tem notícia de fatos como o que li hoje cedo no BlueBus: nos Estados Unidos, 27% da comida disponível é jogada no lixo. Fiquei chocada.
Por curiosidade, fui atrás dos números aqui no Brasil e quase caí pra trás: 40%.
Sim, quase metade do que é produzido é jogado fora. Quase 14 milhões de brasileiros passam fome.É um absurdo. Uma monstruosidade.
E isso acontece por causa de uma lei federal, que pune com até cinco anos de detenção quem oferecer comida em condições inapropriadas para consumo.
Os donos de estabelecimentos comerciais dizem que muita coisa que é jogada no lixo não está estragada, mas não querem correr o risco, porque ao doar comida boa , não têm como saber se vai ser armazenada de maneira correta ou não. E se quem comer passar mal, a culpa é do doador, não importa se quem comeu não guardou ou manuseou corretamente o alimento.
Dá muita pena saber que joga-se fora o que poderia alimentar boa parte da população brasileira.
Acho que com um pouco de organização e boa vontade, é possível reverter esse quadro.
O povo brasileiro, e me incluo nesse meio, precisa parar de olhar os problemas de longe e se envolver. Indignar-se apenas e mudar de assunto não basta. Precisamos entender que reclamar não é suficiente.
Todos apontam o dedo para os problemas, mas ninguém caminha para uma solução. Ninguém se levanta do sofá para fazer algo.
A indignação no nosso país termina quando começa a novela das oito e todos se esquecem do noticiário e vão ser " felizes para sempre".

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Amargor

Quando acordou, naquela manhã ensolarada, Carol já estava rica, mas não sabia.

Abriu os olhos lentamente, olhou pela janela e pensou: "mais um dia quente e abafado”.

Levantou-se de mau humor com aquela constatação. Escovou os dentes, tomou banho e comeu alguma coisa, nada muito pesado, pois estava de dieta.

Aliás, Carol estava sempre de dieta. E de mau humor. Porque todas as manhãs eram ensolaradas, quentes e abafadas naquele canto do mundo, a capital do Rio de Janeiro. “Cidade maravilhosa, hunf, isso aqui é o inferno”.

Achava que não tinha sorte na vida e nada mudaria isso.

Saiu de casa sem dar importância ao pequeno papel com seis números marcados e seguiu rumo ao trabalho, que por sinal era muito cansativo, desestimulante e sem graça, como tudo em sua vidinha medíocre. Carol não sabia, mas naquele momento ela já estava milionária.

E sempre que avistava aquele edifício chique e todo envidraçado, suspirava desanimada e pensava: “eu desejei tanto esse emprego, mas ele é como todos os outros”. No fundo, já sabia que, se fosse coisa boa, não seria para ela.

Guardava seu carro em uma das vagas reservadas aos funcionários da Mirror – Carol era diagramadora em uma das maiores editoras do país, apesar de não entender o motivo daquela droga de lugar ser tão desejado - e murmurava, enquanto saía do carro: “não sei por que paguei tão caro por essa porcaria com quatro rodas, o ar condicionado é péssimo, ou não esfria ou esfria demais, nunca consigo achar um meio termo. E esses bancos de couro grudam na pele, um horror”.

E finalmente Carol pegava o elevador e ia trabalhar. De mau humor. Subia pelo de serviço para não encontrar nenhum colega de trabalho no percurso. “São todos uns falsos, aposto que falam de mim pelas costas”. Para eles, ela era Carolina, Carol era só para os íntimos e, com exceção de seus pais, ninguém era íntimo de Carol.

No final do dia, fazia tudo de novo, mas na ordem inversa. Descia pelo elevador até a garagem, entrava em seu carro detestável, saía daquele prédio medonho, cheio de pessoas antipáticas, que nunca sorriam para ela e ia pra casa jantar. Algo leve, pois estava de dieta.

De tão acostumada com sua rotina, olhou com desprezo para o recibo de aposta da casa lotérica em cima da mesa de jantar. Era azarada demais para ganhar uma fortuna e apesar de apostar toda semana nos mesmos números, nunca havia ganhado nem um centavo. Na verdade, nem perdia seu tempo checando os números sorteados, vencer não era para ela. Para Carol, só restava a rotina.

Ela acreditava que seu nome era muito simples, comum. “Tem música, artista famosa, tem de tudo com o meu nome. Não dá para ser feliz com um nome que todo mundo tem”. E por isso odiava seus pais.

E os culpava por toda uma vida de azar. Tudo estava errado e a culpa era deles, dos pais de Carol.

“Se, pelo menos tivesse sorte no amor”, resmungou ao amassar o maldito papel com as dezenas sorteadas.

Mas não, seus ex-namorados eram cheios de defeitos insuportáveis. Os inteligentes eram feios, os bonitos certamente a teriam traído, ou eram pobres.

E assim, tentando entender o que havia feito para merecer tudo aquilo, jogou a pequena bola de papel na lixeira cromada que provavelmente era mercadoria contrabandeada, pois o preço estava bom demais para ser verdade.

Surpreendentemente, Carol não sentia pena de si mesma. “Tem que ser muito forte para aguentar essa vida miserável”. Afinal, se toda aquela infelicidade não era culpa dela, seus sentimentos, esses ela podia controlar. E havia decidido que não sentiria pena de si mesma.

“Não há nada para mim nesse mundo de Deus”, lamentou-se ao deitar em sua cama king size, que havia custado “ os olhos da cara”, mas não era nada demais, " até meio mole, péssimo para minhas costas".

No dia seguinte, outra manhã ensolarada, Carol repetiu toda a sua sina, pensou os mesmos pensamentos, xingou mentalmente sua cidade natal e comeu algo leve, pois estava de dieta. Mas antes de chegar ao escritório resolveu parar na lotérica que ficava na esquina do edifício envidraçado. “Provavelmente é mais dinheiro desperdiçado”, pensou, ao marcar as mesmas dezenas de sempre.