quinta-feira, 16 de outubro de 2008

3x0

Foi por causa de um jogo de futebol que tudo aconteceu. Ele resolveu mandar um email para ela depois que o time do seu país perdeu para o time do país dela.
Na verdade, muito já tinha acontecido de fato quando, por causa daquela partida os dois se reencontraram.
Sofia era uma carioca que morava em São Paulo. Pablo era um argentino que morava em Buenos Aires.
Se conheceram há mais de uma década pela internet, exatamente da maneira que todos dizem que não se deve conhecer as pessoas. " Eles sempre mentem a altura", " elas nunca são tão magras como nas fotos que te enviam", " os argentinos são uns nojentos, só querem mesmo saber de sexo", " as brasileiras são macumbeiras, essa aí vai te enfeitiçar".
Mas na contramão de todos os comentários muito pessimistas, Pablo e Sofia decidiram se encontrar pessoalmente.
Na época, a Argentina estava afundada numa crise sem precedentes. As coisas estavam realmente ruins para Pablo, um fotógrafo iniciante que era diariamente bombardeado pelo pai - que trabalhava na bolsa de valores - com conselhos para buscar uma profissão mais promissora. Estava cansado de tudo aquilo, mas determinado a insistir em sua vocação. Vivia sozinho em um apartamento de um quarto no bairro da Recoleta, em Buenos Aires e viajava quase todos os finais de semana para Mar del Plata, sua cidade natal, para ver sua família.
Sofia morava ainda na Cidade Maravilhosa, mais precisamente no Leblon. Estudava administração numa faculdade particular e não tinha muito interesse pelo futuro, fazia o que tinha vontade e vivia o momento. Era uma pessoa impulsiva e sincera - "até demais", dizia sua mãe. Sabia que muita gente não gostava do seu jeito e ria disso. Sabia ser fiel a si mesma.
Os dois tinham mais ou menos a mesma idade. Ele dois anos a mais.
E assim ficou decidido. Era janeiro e Pablo passaria duas semanas no Rio, na casa de Sofia.
Foram 14 dias intensos e mesmo sendo a primeira vez que estavam juntos de fato, era como se já se conhecessem há muitos anos. A sintonia era incrível. O amor era recíproco e tranqüilo, como apenas um amor antigo pode ser.
Mas as duas semanas passaram rápido e o contato, antes diário foi ficando menor, até que pararam de se falar.
" Uma dessas coisas tristes da vida", pensava Sofia toda vez que lembrava de Pablo. E toda vez que lembrava dele, uma mistura de sentimentos era o que sentia. " Mas sempre esse frio na barriga".
Sabia que não se veriam novamente, mas o tinha muito presente em sua vida. Nunca falava dele para ninguém, queria-o só para ela, queria aquela história somente na sua lembrança.
Uma vez, quatro anos depois de se encontrarem, ao voltar de uma festa, bêbada, tomou coragem e ligou para ele.
" Vai pensar que sou louca, ligar depois de tantos anos". No fundo, tinha certeza de que o número do telefone tinha mudado. Mas ligou e achou que seu coração fosse sair pela boca quando ele atendeu.
Conversaram banalidades, ela perguntou se ele a amava, ele disse que sim. Mas já estava com outra e não escondeu de Sofia a nova namorada. E ela também estava com outro. Mas Sofia sabia que era apenas mais um. " Não senti o frio na barriga", explicava para as amigas que não entendiam como ela sempre enjoava dos namorados depois de algumas semanas. " Não senti o frio na barriga", explicava para os namorados ao terminar o relacionamento.
No dia seguinte, uma ressaca. Não conseguia lembrar direito o que haviam conversado, mas pouco importava a ela. " A voz dele não mudou nadinha".
Pablo era a pessoa mais sensível que Sofia conhecia e era isso que fazia dele uma pessoa inesquecível.
Pretendentes sempre tinha aos montes, mas escolhia sempre a dedo com quem queria ficar. Depois de muito tempo buscando um traço de Pablo em outras pessoas, finalmente entendeu que precisava mudar, dar a quem realmente podia, uma chance de fazê-la feliz.
E estava se saindo muito bem. Pensava cada vez menos em Pablo, e estava casada e apaixonada por seu marido. Eram muito felizes e todos diziam que eram o casal perfeito, que haviam sido feitos um para o outro.
Até esse jogo de futebol.

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